Faça o que tem que ser feito (ou sobre a importância de ter foco no essencial)
Há uma filosofia que o curso de paraquedismo me deu de presente e que se tornou uma lanterna que ilumina meus dias. No meu primeiro salto do curso, quando eu me preparava para sair pela porta do avião com meu próprio paraquedas, meu instrutor dizia “Independente do que estiver sentindo, faça o que tem que ser feito”.
Ali, em solo, talvez aquela filosofia não fizesse tanto sentido porque era difícil entender como eu contrariaria o combinado, mas a frase ficou se repetindo na minha mente como um mantra.
E então eu me equipei: coloquei o macacão, ajustei o capacete, peguei meus óculos, chequei meu altímetro, testei meus rádios (sim, aluno de paraquedismo usa rádio para ouvir coordenadas e não pousar na casa de ninguém e sim no aeroclube) e coloquei minha mochila com o paraquedas. Completamente equipada era hora de seguir para o avião. Rádio ligado enquanto eu caminhava para o avião, “Paula, braços altos”, fiz os braços altos, “Paula, esquerda, não Paula, es-quer-da”, teste de rádio ok.
Entrar no avião é um dos momentos que produz um pico de adrenalina. “Daqui eu só saio voando”, sempre penso. E lá estava eu, meus dois instrutores do primeiro nível, e outros tantos paraquedistas dentro do Caravan sem portas que subiria até 12 mil pés para enfim nos lançar nos céus de Manaus para testarmos nossa habilidade de voo na queda livre, comandarmos nosso paraquedas a 6 mil pés e pousarmos sãos e salvos no aeroclube de Manaus.
Quando o altímetro marca 10 mil pés iniciamos os procedimentos de checagem novamente. Nessa hora o coração tem picos de alegria e ansiedade e quando o mestre de porta observa que estamos na mira certinha do aeroclube, ele grita para o piloto da aeronave “Corta!”.
O avião diminui a velocidade, se mantém alinhado e os paraquedistas, um a um, seguem para a porta e se lançam no espaço. Talvez meus reflexos e meus instintos de sobrevivência entrem em modo ON nesse momento e me façam pensar mil vezes se aquilo é mesmo algo que um humano sem asas poderia fazer por livre e espontânea vontade. A voz do instinto pede mesmo a vez. E o mantra fazia todo sentindo nesse momento. Independente do que estava sentindo, eu caminhava para a porta do avião, fazia os procedimentos combinados para a saída e saia voando. Independente do que estava sentindo, a 6 mil pés eu comandava meu paraquedas. Independente o que estava sentindo, eu seguia as orientações do rádio e pousava em segurança no aeroclube.
Não interessa se estamos diante da queda livre mais incrível do mundo, faça o que tem que ser feito e comande seu paraquedas na altura combinada. Não interessa se voar sobre onde eu bem entender com meu próprio paraquedas parece algo alucinante, faça o que tem que ser feito e voe sobre a área combinada.
E assim, de “faça o que tem que ser feito” em “faça o que tem que ser feito” criei uma disciplina que não vale só para o paraquedismo, mas para tudo na minha vida.
Se o cansaço é demais para fazer minha corrida matinal, eu vou me levantar mesmo assim e farei minha corrida. Se minha vontade é de trabalhar até altas horas da madrugada, eu largarei meu notebook e me prepararei para dormir as horas que acredito serem necessárias. Se ficar por horas nas redes sociais parece mais atrativo, fecharei todas as janelas e abrirei meu livro. Se meu desejo é devorar as cinco barras de chocolate que estão na geladeira, comerei um tablete apenas. Se o atalho parece mais simples, seguirei pela trilha combinada, pois apesar de mais longa ela vai me mostrar o caminho mais belo. “Faça o que tem que ser feito…”
Com minha lista de desejos e realizações para o novo ano em mãos, vou olhar para os grandes propósitos que tenho nessa vida, no que realmente quero realizar na minha vida e na vida das pessoas, no que é mais valioso e essencial para mim, e vou colocar em primeiro lugar a cada dia da minha vida, como tenho feito há meses, desde que terminei meu curso de paraquedismo.
“Independente do que estiver sentindo, faça o que tem que ser feito” é meu mantra, um ótimo mantra pra todos nós.
Paula Quintão é Escritora, publicitária, montanhista-viajante, paraquedista, mestre em Ciência da Informação pela UFMG e doutoranda em Ciências do Ambiente pela UFAM, fundadora da Equipar Consultoria e Treinamentos. Escreve em seus blogs Manaus pra Mim(manauspramim.com.br) e Um novo Eu (blogequipar.com). Se quiser entrar em contato, é só mandar um e-mail (pgquintao@gmail.com)
Fotos Leonardo Blasch
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Paula,
Parabens pelo texto….. no final de 2013 realizei um sonho de saltar de paraquedas, fiz o salto duplo na área de salto de Praia do Forte -Ba.
Sensacional….. resultado, domingo passado fiz o segundo salto duplo….. Vou fazer o curso AFF, porque é o que tem que ser feito!!!
Uma das opções é justamente Manaus….. se for faço questão de te conheçer, pelo seu currículo tenho muito amaprender!!?
Bons Saltos!!!!
Excelente Artigo!
muito bom!
Lindo artigo,lição de vida para muitos. Independente do que estiver sentindo, faça o que tem que ser feito.